Trilogia Para Todos os Garotos que Já Amei

Trilogia Para Todos os Garotos que Já Amei

Triângulos amorosos, a garota nada descolada ou popular que chama a atenção do bonitinho da escola, uma vilã glamourosa, mas sem nenhum caráter e a repentina morte do pai ou da mãe do protagonista, são clichês que magnetizam a atenção dos fãs de comédias românticas YA e tornam esses enredos um alvo para críticos relutantes em reconhecer sua  popularidade e valor literário. 

Mas para muitos leitores não há clichê maior do que amar a história, mas ser impedido de mergulhar em suas linhas e se camuflar na pele dos personagens pelo fato de não se sentirem representados. 

Quando uma nova comédia romântica para adolescentes é lançada ninguém imagina que a protagonista feminina seja asiática, muito menos que esse traço de sua essência não seja uma questão. Lara Jean é a protagonista da trilogia formada pelos livros Para Todos os Garotos que Já Amei, P.S: Ainda Amo Você e Agora e Para Sempre, Lara Jean, e é meio coreana por parte de mãe, mas apesar de ser bastante claro a autora se preocupou em retratar uma adolescente comum, com medos e experiências iguais as de garotas de todo o tipo.

Jenny Han foi uma adolescente que amava literatura e tudo o que envolvia a cultura pop. Lia e consumia tudo o que fazia sucesso entre os jovens de sua época e se empenhava em reproduzir os penteados da protagonista do seriado Buffy – A Caça Vampiros, fenômeno do final dos anos 90 e início dos anos 2000, contou a escritora em artigo para o New York Times:

Não importava como eu cortava meu cabelo, eu nunca iria parecer com um dos meus ídolos ou nenhuma das garotas do meu querido catálogo da Delia. Nenhuma garota comum iria alcançar esse ideal impossível, mas se ela fosse branca, ela veria uma versão mais glamurosa dela mesma em filmes, capas de revista e TV. Como uma garota asiática-americana, eu não tive essa experiência.

Quando decidiu escrever Para Todos os Garotos que Já Amei, Jenny sabia que sua protagonista seria a personagem que ela gostaria de ter conhecido na adolescência. Entretanto, a indústria cinematográfica parecia não compartilhar do seu ideal. 

Antes mesmo do lançamento do primeiro livro, em 2014, havia interesse de torná-lo filme. Mas o interesse dos produtores desaparecia assim que Jenny deixava claro que a protagonista deveria ser asiática. 

A autora decidiu assinar um contrato com a única produtora que aceitou contratar uma atriz não branca para interpretar Lara Jean. Em 2018 a gigante do streaming Netflix lançou o primeiro dos três filmes previstos com a atriz de origem vietnamita Lana Condor no papel principal. 

Em tempos de filmes de heróis e refilmagens de grandes clássicos, o sucesso de uma comédia romântica com  intérpretes asiáticos provou que há espaço para o protagonismo de minorias em grandes produções. 

Entretanto, o sucesso do filme evidenciou o machismo e a xenofobia institucionalizados na indústria. Após o lançamento do filme a carreira de Lana e de  seu co-protagonista, o ator Noah Centineo, tomaram rumos muito diferentes. 

Enquanto Centineo estrelou vários filmes da plataforma de streaming e foi confirmado no filme do herói He-Man, Lana voltou a fazer papéis secundários em filmes pouco divulgados e entrou para o elenco principal da série Deadly Class, que não passou da primeira temporada. 

Evidentemente produções voltadas para os jovens costumam atrair um público majoritariamente feminino, por isso os galãs ganham maiores holofotes, mas é preciso admitir que a quantidade de papéis oferecidos a atores fora dos padrões é muito limitada. A atores asiáticos são dados papéis de apoio e estereotipados, do melhor amigo, do interesse romântico que logo é descartado ou do nerd vindo de uma família tradicional que se recusa a absorver a cultura americana. 

Mesmo assim, e ainda que a passos pequenos, o entretenimento consumido por Jenny Han em sua adolescência vem passando por mudanças. Há uma tendência do mercado em se livrar de velhos estereótipos e abrir espaço para mais diversidade nos elencos de suas produções. A série Elementary (2012-2019), por exemplo, deu uma roupagem mais moderna para  Sherlock Holmes usando a cidade de Nova York como cenário e a atriz sino-americana, Lucy Liu, no papel de Watson. 

A adaptação do livro de Kevin Kwan, Asiáticos Podres de Ricos, fez um enorme sucesso em 2018 e conta com um elenco inteiramente asiático, com a atriz Constance Wu no papel principal. A atriz, aliás, também protagoniza a série americana  Fresh Off the Boat, sobre uma família chinesa que se muda de Chinatown, em Washington, para Orlando e precisa se adaptar às diferenças culturais da nova cidade. 

O estúdio de animação Dreamworks, responsável por Shrek (2001), Como Treinar o seu Dragão (2010) e Madagascar (2005), lançou em 26 de setembro o longa metragem Abominável, como a primeira protagonista asiática criada pela empresa. 

Prazer, Lara Jean

Lara Jean escreve cartas para os garotos pelos quais ela se apaixona. Mas apesar de serem escritas para outras pessoas o destinatário dessas cartas é a caixa de chapéu que fica guardada no alto do armário da garota, já que ela as escreve como forma de se despedir de amores que nunca teve coragem de deixar saírem de seu coração. Um dia, elas são enviadas sem o consentimento de quem as escreveu, causando uma grande confusão. 

Em entrevista para o site brasileiro Capitolina Jenny Han afirmou que começou a escrever quando ainda era uma adolescente e, por isso, criar histórias sobre essa fase da vida parecia natural para ela. Hoje, a autora tem 39 anos e continua a se dedicar a dar voz à juventude.

Penso que a adolescência é universal, todo mundo passa por isso. E acho que há algo muito envolvente em histórias sobre essa época, porque é uma época em que se experimenta muitas coisas pela primeira vez e acho que as primeira vezes são as partes mais interessantes de uma história.

Umas das coisas que mais atraem os leitores de  Young Adult, seja eles adolescentes ou adultos, é a proximidade dos acontecimentos. Em uma história Young Adult nenhuma primeira vez é boba. Mesmo sabendo que a personagem tem a vida inteira pela frente uma boa história jovem resgata a sensação de que o primeiro beijo, a primeira desilusão amorosa ou uma briga entre amigos são as melhores coisas do mundo ou as piores tragédias.

Esse tipo de história é repleto de clichês, sabemos exatamente o que vai acontecer e  para onde os personagens estão caminhando, mas mesmo assim escolhemos trilhar esse caminho com  entusiasmo. Esse caminho, repleto de ladrilhos conhecidos, representam nossos anseios por uma vida emocionante.

A personagem principal e o livro exalam a mesma essência. Assim como os clichês românticos, Lara Jean é previsível. Usa sempre as mesmas roupas, faz sempre as mesmas coisas todos os dias e todas as horas. Mas esse livro é diferente, traz uma protagonista mestiça, com elementos coreanos aqui e ali que, apesar de sutis, fazem de Lara Jean uma protagonista igual, mas diferente de todas as outras. Assim como as diferenças sutis do livro a protagonista descobre seu desejo por sair do comum a que estava habituada e descobrir partes diferentes de si mesma. 

Lara Jean não tenta ser uma garota tímida, a típica loser, ou a super popular, ou a garota linda que não sabe que é linda. Lara Jean Song Covey é apenas ela mesma. Ou melhor, ela é principalmente ela mesma.

Além disso, por meio do relacionamento de Peter e Lara Jean, podemos vislumbrar o que acontece depois do final feliz. Normalmente, em livros desse gênero pessoas opostas se apaixonam e ficam felizes para sempre, mas a autora se preocupou em retratar o depois, quando a convivência torna as diferenças e inseguranças mais aparentes e menos românticas. 

Jenny Han se apropriou de forma magistral de um clichê a qual todos somos apaixonados, transformando sua protagonista, a quem protegeu a todo custo, no espelho que gostaria de ter se admirado enquanto crescia e descobria o mundo a sua volta.

*Ilustração desenvolvida por Matheus Silva s especialmente para o Vira-Tempo.

Para Todos os Garotos que Já Amei

Para Todos os Garotos que Já Amei

  • Autor: Jenny Han
  • Tradução: Regiane Winarski
  • Editora: Intrínseca
  • Ano de Publicação: 2014
  • Nº de páginas: 304

Lara Jean guarda suas cartas de amor em uma caixa azul-petróleo que ganhou da mãe. Não são cartas que ela recebeu de alguém, mas que ela mesma escreveu. Uma para cada garoto que amou — cinco ao todo. São cartas sinceras, sem joguinhos nem fingimentos, repletas de coisas que Lara Jean não diria a ninguém, confissões de seus sentimentos mais profundos.
Até que um dia essas cartas secretas são misteriosamente enviadas aos destinatários, e de uma hora para outra a vida amorosa de Lara Jean sai do papel e se transforma em algo que ela não pode mais controlar.

Comentários: